Depois de acertar para viajar de
clandestino no “Trem da Morte”, nós seis (Eu, meu primo, as duas
cariocas e as duas paulistas) fomos para o último vagão do trem.
Aliás, vale ressaltar que os bolivianos não gostam que chamem o
trem de “Trem da Morte”, eles dizem que não existe trem da morte
na Bolívia.
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Procurado pela maioria dos mochileiros que vão à Bolívia, o trem que vai de Puerto Quijarro à Santo Cruz de la Sierra é uma atração turística. |
Um policial ficou com nossos RG's até
pagarmos. O próprio responsável pelo trem é que receberia a nossa
“propina” para viajarmos sem passagem. Ficou combinado que as
quatro mulheres viajariam na mesma poltrona até Santa Cruz, eu e meu
primo teríamos que ir trocando de poltrona conforme os donos fossem
chegando e a partir de San José dos Chiquitos iriamos no vagão
restaurante. Fazer isso me pareceu bem melhor do que passar uma noite
em Puerto Quijarro.
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A grande maioria dos mochileiros que estavam no trem era de brasileiros. |
Duas horas depois do trem sair já
tivemos que trocar de lugar, o detalhe é que seriam 16 horas de
viagem e em apenas duas já havia começado nossa dança das
poltronas. Demos sorte pois, nesta primeira mudança fomos para um
vagão menos quente e mais espaçoso. A poltrona também reclinava
mais. Conosco estavam mais seis clandestinos e foi nesse vagão que
passamos o maior perrengue.
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Com a peregrinação das poltronas pudemos conhecer quase todos os vagões e notamos que quase não há diferença entre eles. |
Quem toma conta e fiscaliza o
transporte na Bolívia é o exército. Estávamos dormindo quando as
luzes se acenderam e um soldado do exército começou a verificar os
lugares e as passagens do nosso vagão. Nesse momento veio um frio na
barriga e uma certa ansiedade, afinal não tínhamos passagem. Cada
vez que eu ouvia ele pedindo as passagens dava um nó na minha
garganta, até que ele finalmente chegou nos nossos lugares e
perguntou: ¿Pasajens? E eu respondi: No tengo. Ele colocou as mãos
nas duas poltronas, na minha e na da frente, como se fechasse para
não fugirmos, olhou bem nos meus olhos e disse: ¡Ah, no tienes!
Nesse momento o desespero ficou explícito nas nossas expressões. A
única coisa que passava na minha cabeça era “E agora?” A
possibilidade de ser preso ou ter que encerrar a viagem logo no
terceiro dia me assombrava. Foi quando o homem responsá
vel pelo trem
apareceu meio que correndo e falando alguma coisa que eu não
consegui entender. O soldado nos olhou como se dissesse “conseguiram
se safar heim” e foi embora fazendo seu trabalho. Uma sensação de
alívio tomou conta de mim.
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Foi por esta porta que o soldado entrou e começou nosso sufoco. |
À 1h30 tivemos que mudar de lugar de
novo, já estávamos em San José. Não precisamos ir para o vagão
restaurante, ficamos na parte da frente do vagão que estávamos.
Desta vez fomos no mesmo lugar até Santa Cruz. Assim como a saída,
a chegada foi pontual. 8H da manhã desembarcamos no terminal bimodal
de Santa Cruz de la Sierra.
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Depois de 16 horas de viagem, o destino estava bem próximo. |
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Desembarque pontual na Estação Bimodal de Santa Cruz de la Sierra. |
Demos uma volta pelo centro da cidade
procurando um lugar para tomar banho. Meu último banho tinha sido em
casa, antes de sair para a viagem. Na primeira volta não encontramos
lugar, então decidimos comprar as passagens para La Paz. 170
bolivianos, ônibus leito e mais 16 horas de viagem. Na própria
rodoviária tomamos banho gelado num banheiro que tinha aparência
abandonada. Os chuveiros ficavam no subsolo, dava para ver os pés
das pessoas andando pelo terminal. Paguei 3 bolivianos pelo banho, o
equivalente a R$ 0,50, mas valeu cada centavo! Tomar banho depois de
38 horas de estrada, dois dias de viagem é sensacional.
De banho tomado e energia renovada,
fomos dar uma volta para conhecer um pouquinho de Santa Cruz de la
Sierra. Ficamos por perto da rodoviária e fomos parar numa praça,
até que bem bonita e bem cuidada. O mais interessante dessa volta
foi ver os carros. Cada carro estranho, bem diferentes dos que
estamos acostumados a ver. Aqui uma Honda Bros nova custa 1200
dólares. Achei legal perceber a diferença da situação econômica
entre Brasil e Bolívia. No Brasil são poucos os carros velhos e
caindo aos pedaços, o povo já tem poder aquisitivo suficiente para
manter uma frota mais nova país. Já na Bolívia é o contrário,
são poucos os carros novos circulando.
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Passamos um bom tempo nesta praça vendo o movimento enquanto esperávamos o horário de partida para La Paz. |
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Ela pode ser mais barata que aqui no Brasil, mas pode-se observar pela marca do motor que a moto não é 100% original. |
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A grande maioria dos carros bolivianos são de origem japonesa. |
15h é o horário da nossa partida para
La Paz. Mais 16 horas de estrada, e agora subindo. Saíremos dos 416m
de altitude de Santa Cruz para os 3660m de altitude em La Paz. Depois
de encarar o desafio de viajar de clandestino no trem, nosso próximo
desafio vai ser encarar o soroche, também conhecido como mal de
altitude.
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Juninho, Luiza, Julia e eu, clandestinos do trem. |
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Já na estrada rumo à La Paz. |